O Sporting Clube de
Portugal, segundo classificado na passada edição da Liga Portuguesa após uma
época marcada pela ausência de expectativas, encara na presente temporada um
novo desafio: o de consolidação do seu lugar na elite nacional, com a respetiva
repercussão nas provas europeias, acarretando assim maior carga competitiva e
um plantel mais robusto. Apesar da saída de Leonardo Jardim, o técnico que foi
a figura chave na época fantástica dos leões, a direção optou por manter a
aposta num treinador ambicioso, apreciador do futebol apoiado de posse e
ofensivo, enveredando para Marco Silva, que conduziu a equipa do Estoril Praia
às (até então, inéditas) competições europeias por duas temporadas
consecutivas. Com um número de novas contratações e de repescagens à equipa B,
a formação de Alvalade venceu todas as partidas que disputou em solo lusitano e
partiu para o estágio holandês com dois troféus assegurados, sendo eles o
Troféu Pedro Pauleta e a Taça de Honra.
O estágio do Sporting
na Holanda teve como base a vila de Doorwerth e estipulou três particulares: o
primeiro contra o RKSV Achilles '29, vigésimo classificado da segunda liga
holandesa de 2013/14 e, por isso, despromovido; o segundo diante da formação do
FC Utrecht, 10º classificado da Eredivise de 2013/14; e o último face ao
terceiro classificado da mesma competição FC Twente.
Na primeira partida,
o timoneiro Marco Silva concedeu oportunidades a elementos mais desvirtuados do
onze base da vitória na Taça de Honra e da época passada, com a introdução de
dez novos elementos comparativamente a essa formação e com o lateral esquerdo
Jefferson a ser o único futebolista presente em ambas as eventualidades. Com um
entrosamento naturalmente menos evidenciado, os centrais Tobias Figueiredo e
Paulo Oliveira mostraram-se tranquilos no tratamento da bola e surgiam com
frequência na grande área mas viam-se facilmente explorados em incidências de
ataques rápidos. O meio-campo dispôs de pouca coesão e de mais iniciativas
individuais, com Wallyson e Slavchev ainda a exibirem-se de modo tímido mas com
alguns momentos de valor e João Mário a servir de ponte de conexão entre os
diversos setores, mostrando-se um box-to-box relevante e que pode facultar
dores de cabeça ao técnico Marco Silva. Quanto às alas, André Geraldes manteve
uma postura sóbria defensivamente mas com pouco acréscimo ofensivo a Shikabala
enquanto Jefferson e Carlos Mané mostravam-se dispostos em fazer combinações
com menos intensidade mas com vista ao serviço do reforço japonês Junya Tanaka,
que demonstrou ter o oportunismo necessário para se firmar como uma opção
válida na dianteira ao faturar um hat-trick. As substituições efetuadas pelo
treinador permitiram que tanto os restantes reforços como outros pupilos da
formação se mostrassem, destacando-se destes Heldon pelo golo marcado e Ryan
Gauld, uma das grandes promessas do futebol escocês, a mostrar belas
combinações com João Mário e Simeon Slavchev que viabilizaram a dilatação de
uma vitória justa por 5-2.
Na segunda partida,
diante de um adversário mais capaz e ameaçador, o Sporting atuou com um onze
mais condizente com os usados nas duas partidas relativas à Taça de Honra,
dispondo apenas de um reforço no onze inicial e sendo ele o espanhol Oriol
Rosell, que voltou a dar nas vistas. Com uma exibição inspirada de Marcelo
Boeck tendo defendido um penálti, a equipa dos leões demonstrou todo a coesão e
o trabalho desenvolvido na temporada prévia a ser catapultado para esta, com
Marco Silva somente a insistir nas combinações práticas a derivarem para as
alas (Carrillo esteve em grande destaque, com mais camaradagem e não tanta
obsessão no porte da bola, ao contrário de Capel) e com o meio-campo a servir
de suporte no ataque nas zonas de finalização (André Martins surge quase como
um segundo avançado numa estrutura tática teoricamente estipulada como 4x3x3 e
voltou a abanar as redes da baliza adversária e Adrien esteve na origem dos
dois primeiros golos com remates potentes que originaram defesas incompletas).
Sentiu-se também que esta zona central do jogo da equipa de Lisboa perdeu
poderio físico com a ausência de William Carvalho (que entretanto entrou e
mostrou a sua positiva influência defensiva) mas ganhando mobilidade e
abnegação no capítulo ofensivo, estando, no capítulo do passe, com níveis de
eficácia similares aos do seu concorrente direto. Os centrais Maurício e Eric
Dier revelaram poucos erros de posicionamento e elevados índices de agressividade
a cada lance disputado, enquanto os laterais mantiveram uma preponderância
ofensiva e sintonia com os seus parceiros de corredor, enquanto que Fredy
Montero bem tentou “matar o borrego” de jogos consecutivos sem marcar mas sem
sucesso e muito se devendo à sua envolvência como elemento de equipa e não
tanto como finalizador nato. Quanto à segunda linha que entrou na segunda
parte, esta não evidenciou a qualidade e as rotinas prementes com a equipa que
atuou no primeiro período, abrindo mais espaços para o Utrecht e permitindo
mais posse por parte dos holandeses no meio-campo contrário. Os destaques,
todavia, são alguns, tais como a frieza de Tanaka, o virtuosismo de Carlos
Mané, as virtudes a pêndulo de João Mário e a surpresa de Esgaio ao atuar com eficácia
na ala esquerda, apesar da sua preferência derivar para a direita. Novamente um
triunfo merecido de um Sporting com mais maturidade tática, maior entrosamento,
eficácia e com argumentos de assumir a identidade defendida por Marco Silva,
tanto como uma equipa que pode funcionar tanto como uma de transições rápidas e
de eficientes variações de flanco por parte da bola como de uma equipa com bola
no pé por algum tempo visando constantemente a baliza.
No último e mais
árduo encontro, diante da formação holandesa do FC Twente, o Sporting foi
derrotado por 2-0 e, apesar de perfilar com somente dois reforços, produziu um
jogo menos conseguido. A formação lisboeta sentiu-se incomodada com uma pressão
inicial no seu meio-campo por parte do oponente, sofrendo o golo numa casual
oportunidade onde Eric Dier falhou na cobertura física. No resto do processo
defensivo, toda a linha defensiva mais William Carvalho cumpriu na restante
envolvência da primeira parte, especialmente no capítulo da antecipação ao último
passe e com uma boa exibição do reforço lateral-direito André Geraldes. Quanto
ao ataque, as alas, com André Carrillo e Carlos Mané, foram facilmente anuladas
pelos laterais holandeses e, por conseguinte, poucas oportunidades foram
geradas para que Junya Tanaka pudesse replicar o gosto ao pé tal como nas duas
transatas partidas. O meio-campo não funcionou, com Adrien e André Martins a
não colaborarem de forma tão assídua no processo ofensivo e com estes e William
Carvalho a falharem copiosamente passes e a não encontrarem soluções para
romperem com a poderosa defesa da equipa de Enschede. No segundo tempo, desde
logo entraram Fredy Montero, Diego Capel e os reforços Oriol Rosell e Paulo
Oliveira para os lugares de Junya Tanaka, de Carlos Mané, de William Carvalho e
de Eric Dier. A equipa de Alvalade a espaços conseguia perturbar o guarda-redes
holandês mas sem a eficácia desejada e com limitações após a expulsão de
Maurício por acumulação após este colocar o esférico dentro da baliza com a
mão. Um encontro menos conseguido sem que o Sporting colocasse em prática os
processos defendidos pelo técnico Marco Silva em que as diagonais foram
escassas e, quando cumpridas, não tiveram a devida prossecução, com o
meio-campo com fugazes iniciativas sem originar verdadeiros sobressaltos à
defesa adversária e com a defesa a cumprir no papel mas com alguns lapsos que
levaram a que o resultado favorecesse a equipa anfitriã.
Em suma, o estágio do
Sporting Clube de Portugal ficou-se por um sentimento algo amargo após duas
vitórias e uma derrota diante da equipa com argumentos mais equiparáveis aos
dos leões. Destacam-se algumas nuances novas introduzidas pelo novo treinador
Marco Silva ao trabalho já desenvolvido na transata época por Leonardo Jardim e
muito reciclado pelo ex-Estoril, tais como os maiores níveis de posse de bola e
a tentativa de construir jogo de forma paciente mas objetiva a partir da
defesa, apelando a uma circulação de bola apoiada e com tendências
diversificadas, tanto com privilégio para os flancos como diretamente para os
elementos mais avançados, mas também a insistência nos ataques rápidos e na
tentativa de apanhar a defesa adversária no contrapé, reforçando a
imprevisibilidade da equipa. Quanto aos processos defensivos, existem mais
elementos concentrados no seu meio-campo e uma marcação mais zonal do que
corpo-a-corpo, com os extremos tanto a apoiarem atrás os seus companheiros como
a atrapalharem os centrais na sua construção, potenciando a existência de
vários golos através destes movimentos. Na ocasião em que enfrentou uma equipa
mais possante e capaz de contrariar o domínio verde-e-branco, a equipa revelou
algumas lacunas especialmente na clarividência ofensiva e no deslumbramento com
a bola nos pés, levando a vários cortes fáceis dos opositores. Notas positivas
para a eficácia de Junya Tanaka (4 golos em 2 encontros), a segurança de
Marcelo Boeck (penálti defendido e tranquilidade no jogo com os pés), a
dinâmica de Oriol Rosell na primeira linha de construção ofensiva, chegando com
facilidade à área contrária para dar suporte a este trabalho; e a sintonia
entre Adrien Silva e André Martins na segunda partida, mostrando boas
articulações com as alas e forte presença no terreno do adversário. Os testes
que se avizinham serão, no geral, ao nível deste mais recente desencadeado pelo
FC Twente e, por isso, servirá para aprimorar as rotinas menos compreendidas e
expostas em campo, desta feita com Rui Patrício, Marcos Rojo e Islam Slimani já
reintegrados na equipa.
Artigo escrito por: Lucas Brandão
Imagens: anortedelvalade.blogspot.com / record.xl.pt / amorsporting.com / desporto.sapo.pt
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