3 de março de 2014

«Dragão» adormecido ou abatido?

   Nos últimos tempos muito se tem comentado acerca da crise que paira sobre o FC Porto. Os “dragões” têm vindo a desiludir a sua massa adepta, apresentando um futebol pouco cativante, sem ideias, sem brilho. Às exibições cinzentas juntam-se resultados pouco convincentes quando estamos prestes a entrar na fase decisiva da época.

   Perante este cenário cinzento que tem assolado o reino do Dragão parece-me pertinente fazer uma análise ao FC Porto, apontando os motivos que, na minha opinião, estão a conduzir os azuis e brancos a uma fraca prestação até ao momento.

   Começo por referir a escassez de soluções a nível de plantel, numa equipa que joga em várias frentes para ganhar. O caso mais gritante é o dos laterais brasileiros Danilo e Alex Sandro. As suas qualidades são inquestionáveis mas o que ressalta nesta análise é a falta de soluções no plantel para colmatar uma eventual ausência dos jogadores canarinhos que, deste modo, são “forçados” a um esforço físico suplementar, sem direito a descanso. Num setor tão importante como é o setor defensivo, esta falta de soluções implica, seguramente, a médio prazo um enorme desgaste dos atletas em questão, o que afetará o rendimento da equipa. Ambos os laterais têm-se revelado, ao longo da sua estadia na cidade Invicta, um importante apoio à manobra ofensiva portista, o que só é possível mediante alguma frescura física que, inevitavelmente, será cada vez menor, uma vez sujeitos a várias dezenas de jogos ininterruptos.

   A «dança» de jogadores no meio-campo portista desde o início da época também é um fator de instabilidade a apontar. O centro do terreno, foco nevrálgico de qualquer equipa necessita de segurança e estabilidade, características que este FC Porto não tem conseguido alcançar, fruto das sucessivas mudanças impostas pelo seu treinador Paulo Fonseca. No início da época foi muito comentada a inversão do triângulo de meio campo, com dois pivôs defensivos. Com o passar dos jogos, Fernando voltou a ocupar aquela zona do terreno sozinho, como tão bem sabe fazer. O “Polvo” teve a companhia de Josué, Defour, Lucho, Herrera, Carlos Eduardo, Quintero… Demasiados jogadores para apenas dois lugares. Esta rotatividade prejudicou a equipa que, desde agosto (ainda) não conseguiu encontrar um 11 base. A situação agravou-se com a saída de Lucho, em janeiro, rumo ao Catar.

   Por outro lado, observando o plantel do FC Porto denota-se uma diminuição na qualidade dos seus intérpretes, o que dificulta a tarefa do treinador principalmente na altura de mexer no jogo a partir do banco. Jogadores como Licá, Carlos Eduardo, Josué, Ricardo ou Ghilas chegaram este verão ao FC Porto, provenientes de clubes portugueses de menor dimensão. Embora já estivessem adaptados à realidade do futebol português, envergar a camisola azul e branca tem outro peso e outra responsabilidade para os quais estes não estavam preparados. Licá e Josué começaram a titulares e até se exibiram a um nível interessante, mas com o decorrer dos jogos pouco acrescentaram. O primeiro tem revelado pouca qualidade para ser titular num grande enquanto o segundo é ainda um jogador muito intempestivo, com “sangue na guelra”, capaz do melhor e do pior. O caso de Ricardo é um pouco diferente visto que se trata de um jovem que passou por um período de adaptação na equipa B portista. Contudo, ainda não apresenta níveis para ser uma opção credível para um FC Porto que se quer ganhador em todas as frentes. Em virtude das carências do plantel portista, fez alguns jogos a lateral. O argelino Ghilas chegou ao Porto proveniente do despromovido Moreirense. O seu valor, perto de 4 milhões de euros por 50% do passe (falou-se em 3,8 milhões) foi manifestamente exagerado e raramente teve oportunidades para mostrar serviço. Diga-se que jogar 5 ou 10 minutos numa fase de desespero também não é muito saudável para a evolução do jogador.

   Em suma, o FC Porto investiu, no início da temporada, em vários jogadores que não tiveram um especial impacto na equipa. Diego Reyes foi caro e nem com a saída de Otamendi em janeiro teve oportunidades de se exibir. Paulo Fonseca preferiu fazer regressar Abdoulaye, que estava a realizar uma boa época em Guimarães. O jovem senegalês tem sido aposta no campeonato nacional enquanto o mais experiente Maicon tem sido opção para as competições europeias. Esta parece-me ser uma má opção de Fonseca. Maicon já demonstrou por diversas vezes o seu valor, é muito forte nas bolas paradas, tem alguns anos de casa e inclusive já capitaneou o FC Porto. Pela sua experiência e competência ficar reservado para as competições europeias é algo que me faz confusão. Por outro lado o facto de Abdoulaye ser titular no Vitória SC não o torna uma opção incontestável para o eixo defensivo do FC Porto (a nível interno). A exigência é totalmente distinta, os objetivos das respetivas equipas são incomparáveis. E, diga-se, estas mudanças efetuadas pelo treinador portista não conseguiram inverter o percurso descendente da equipa, bem pelo contrário. A crise exibicional transformou-se numa crise de resultados e a contestação subiu de nível.

   E como se pode explicar o desaparecimento de Quintero? O virtuoso jovem colombiano que no início da época foi uma das revelações da equipa desapareceu das opções de Paulo Fonseca. Quando estamos perante o FC Porto mais fraco dos últimos anos, que se apresenta sem chama e criatividade é, no meu ponto de vista, incompreensível este «eclipse» do colombiano que tanto prometeu. A sua técnica e criatividade poderiam iluminar o FC Porto para o que sobra desta época.

   Aquela que, na minha opinião, é a maior prova do laxismo que se tem vivido no FC Porto é o facto de Ricardo Quaresma, já com 30 anos, com um histórico recente de problemas físicos e após dois anos afastado da ribalta futebolística, chegar e converter-se na estrela da equipa, como sendo o “salvador da pátria”. Mérito para o internacional português que tem sido dos poucos a remar contra a maré.

   Este desleixe no que diz respeito ao planeamento da época desportiva tem tido um custo muito elevado para o FC Porto que esta época não conseguiu vencer um único jogo em casa a contar para a Liga dos Campeões sendo relegado para a Liga Europa após não ter conseguido a qualificação num grupo onde poderia (e deveria) ter feito bem melhor. No que ao campeonato nacional diz respeito, esta temporada já perdeu mais pontos do que em toda a temporada transata. Encontra-se atualmente no terceiro lugar, a 9 pontos do líder SL Benfica (com a agravante de já ter perdido no Estádio da Luz), a 4 pontos do segundo classificado, o Sporting CP (que tem um orçamento bastante inferior ao do campeão nacional em titulo) e apenas com mais 4 pontos de vantagem em relação ao quarto classificado, o GD Estoril-Praia (que recentemente “gelou” o Estádio do Dragão ao derrotar o FC Porto por 0-1 naquela que foi a primeira derrota em casa do conjunto azul e branco para a liga desde 2008).

   A equipa do FC Porto após ter atravessado uma crise de resultados em meados de novembro e inícios de dezembro, com dois empates consecutivos perante o Belenenses e o Nacional, e uma derrota, em Coimbra, ante a Académica conseguiu estabilizar um pouco a contestação, regressando às vitórias. Todavia, o nível exibicional apresentado pela equipa nunca conseguiu convencer os exigentes adeptos portistas. A derrota com o Benfica (sempre difícil de digerir), a derrota caseira com o Estoril e o empate em Guimarães depois de estar a vencer por 0-2, reacenderam os alarmes no Dragão. Este ciclo negativo teve uma interrupção em Frankfurt, onde a equipa portista, apesar do sofrimento, conseguiu seguir em frente na Liga Europa, ultrapassando o desaire caseiro que foi a primeira mão dos 16 avos de final da competição, onde, após estar a vencer confortavelmente por 2-0, o FC Porto permitiu o empate. No entanto, o empate deste último domingo nas circunstâncias que ocorreu fez renascer a contestação que subiu de tom. A continuidade de Paulo Fonseca tem sido seriamente posta em causa. Exibições muito pobres, quebras de concentração, a descrença manifestada, a passividade e o desgaste apresentados levaram a uma quebra psicológica evidente. O Estádio do Dragão tem recebido menos público, os adeptos estão impacientes, Paulo Fonseca já pediu por três vezes para sair…

   Mergulhado numa crise desportiva, o FC Porto também não atravessa o melhor momento a nível financeiro. Isto ficou bem patente nas contratações de verão, na manifesta dificuldade em vender jogadores no mercado de janeiro e nas novelas em torno das renovações de Fernando e Jackson Martínez. O clube apresentou um prejuízo de 29,2 milhões de euros no primeiro semestre de 2013/2014.

   Este cenário não é nada animador para os adeptos do FC Porto. A luta pelo título está complicada mas não totalmente comprometida. O clube continua em várias frentes com possibilidades de vencê-las. Resta esperar para ver até onde pode chegar este «dragão» e se conseguirá desembaraçar-se deste marasmo psicológico e exibicional que tem abalado a equipa.

   A bola está no lado da direção, equipa técnica e jogadores do FC Porto. Todos partilham responsabilidades acerca desta (má) temporada, mas a verdade é que ainda nada está perdido. Veremos se o «dragão» conseguirá acordar a tempo de evitar a consumação da pior época dos últimos anos.

Artigo escrito por: Adolfo Serrão
Imagens: futebolportugal.clix.pt / rr.pt / ojogo.pt / jn.pt 

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