28 de agosto de 2014

Serie A 2014/15: o remar contra a obsoleta maré do Catenaccio

   Com a maioria dos campeonatos do Velho Continente a já terem arrancado, a primeira liga italiana, também conhecida como Calcio ou Serie A, será iniciada no último fim-de-semana de Agosto e com o habitual formato de vinte formações que se debatem em trinta e oito partidas. Com a Juventus FC a ser a grande favorita para dar seguimento ao seu tricampeonato e consolidar um recorde, a AS Roma e o SSC Napoli aprumaram-se tanto em quantidade como em qualidade individual e coletiva e prometem ser fortes ameaças ao trono dos "bianconeri". Com a ACF Fiorentina (com Mário Gómez pronto a exibir em pleno todos os predicados de goleador que lhe moldaram a carreira) e as formações milanesas FC Internazionale Milano e AC Milan destinadas a competir por um lugar europeu, não estarão isoladas pois tanto o Parma FC como a SS Lazio e o Torino FC se mostram com argumentos de vulto para animar uma competição que tem sido vista em quebra, com a fraca competitividade pelo primeiro lugar e pelos desempenhos menos assinaláveis num panorama europeu a comprovarem esta teoria e a urgir uma mudança de paradigma do estilo futebolístico imposto pela velha escola transalpina.

  Começando por uma análise pormenorizada do defeso de cada formação, saluta-se primeiramente a tricampeã Juventus FC, que sofreu uma debandada no comando técnico, com o herói da casa Antonio Conte a não acordar com a direção na política de contratações e a dar lugar ao fortemente contestado Massimiliano Allegri, ex-técnico e campeão pelo AC Milan na época de 2010/2011. Mantendo-se como a grande favorita para arrecadar o campeonato e, por conseguinte, o inédito tetra nos pergaminhos do clube por manter a base da equipa da temporada transata e por reforçar cirurgicamente algumas posições que careciam de menos soluções, como com o lateral esquerdo Patrice Evra, os médios Rômulo e Roberto Pereyra ou o avançado espanhol Alvaro Morata. Discutindo-se ainda mais entradas, outro dos objetivos desta campanha trata-se de um registo mais condizente com o historial dos turinenses na Liga dos Campeões.

   Numa segunda linha, seguem-se os restantes declarados candidatos ao título, com as equipas da AS Roma e SSC Napoli. A primeira, treinada pelo francês Rudi Garcia, mostrou surpreendentes níveis de consistência na temporada passada, acrescentou soluções ao plantel, tanto irreverentes (Juan Manuel Iturbe, estrela no Hellas Verona) como experientes (Ashley Cole ou Seydou Keita) e manteve as pedras basilares do êxito da campanha transata, tendo mais argumentos para a disputa vindoura. Quanto à formação do sul de Itália, o treinador Rafael Benítez possui um leque de ótimas individualidades mas que foi adquirindo processos coletivos consoante a época passada ia decorrendo, apesar de conquistar a Coppa Italia à Fiorentina. A ameaça proveniente desta equipa intensificar-se-à na problemática relativa ao título, apesar de ressentida com as saídas de Valon Behrami ou Pablo Armero.

   Nos lugares relativos à qualificação para os lugares europeus, podemos integrar clubes como os eternos rivais de Milão, FC Internazionale Milano e AC Milan, Parma FC, TorinoFC , ACF Fiorentina ou SS Lazio. A equipa do AC Milan não garantiu a presença nas competições europeias na passada temporada e foi vítima de uma remodelação ao nível da equipa sénior. Saiu Clarence Seedorf e entrou outro menino pródigo da casa dos rossoneri para o leme de uma estrutura com muitas caras novas, como Jérémy Ménez, Pablo Armero ou o campeão europeu Diego López. Quanto ao Inter, que já iniciou a sua época oficial na Liga Europa à semelhança do Torino, conseguiu dotar, a partir do técnico Walter Mazzari, o seu plantel de mais soluções, como o ingresso de Nemanja Vidic, de Daniel Osvaldo e outros elementos que, maioritariamente, figuraram como destaques da Serie A. A Fiorentina garantiu um posto na fase de grupos da Liga Europa após um campeonato algo oscilante mas cumprido, com Vincenzo Montella a estrear-se no comando de uma equipa profissional e a manter-se. Com Mario Gomez desta vez na máxima força e a querer prolongar o seu pecúlio goleador, a formação viola conseguiu uma pré-época praticamente imaculada e com vários registos interessantes diante de equipas de qualidade.

  Partido um pouco atrás das formações acima expostas, o Torino, que beneficiou da desqualificação do Parma da Liga Europa por incumprimento de prazos no pagamento de taxas, ingressou nesta e reforçou-se com elementos de larga experiência no futebol italiano como Cristian Molinaro, Antonio Nocerino ou Fabio Quagliarella, terá uma palavra séria a dizer no que toca a estes postos, com o veteraníssimo Giampiero Ventura a guiar esta equipa. O Parma, do central português Pedro Mendes, parte com um plantel pouco mexido neste defeso e será outra formação a ter em conta, assim como a Lazio, de Bruno Pereirinha, que conta com uma equipa matura e disponível para estas andanças, apesar do currículo do novo técnico Stefano Pioli deixar algo a desejar.

   Quanto às contas da permanência e com a Udinese do virtuoso Bruno Fernandes e do veterano Di Natale (treinados agora pelo italiano Stramaccioni), o Hellas Verona de Luca Toni e o Genoa um patamar acima das restantes; existem várias formações que vão animar a luta por estes lugares, relembrando que Livorno, Bolonha e Catania foram despromovidos ao inverso do Palermo, do Empoli e do Cesena e afigurando-se as formações do Chievo de Verona, do Cagliari, do Empoli e do Cesena como as mais propícias a acabarem na Serie B em Maio. Destacam-se algumas individualidades nas coletividades que se englobam nesta questão, como Domenico Berardi do Sassuolo a afirmar-se como um caso sério no ataque e afigurando-se como uma futura mais-valia na Squadra Azzurra ou o experiente Francesco Tavano, de 35 anos, que foi crucial na promoção do Empoli com 17 golos.

   Sistematizando, a Serie A dispõe de três grandes focos de interesse: a luta pelo título entre Juventus FC, AS Roma e SSC Napoli; o embate para a conquista dos lugares europeus entre FC Internazionale Milano, AC Milan, SS Lazio, Torino FC, ACF Fiorentina e Parma FC; e a fuga à despromoção à Serie B, com as restantes formações excluindo talvez a Udinese Calcio, o Hellas Verona FC e o Genoa CFC a fazerem parte do lote de integrantes nesta luta. Apesar de uma nova geração de treinadores emergir, as reformulações necessárias para se atingir voos outrora tangíveis a nível continental tardam em surgir, com ideias expostas ainda de forma tímida em equipas como a Fiorentina ou o Nápoles, que tentam jogar um futebol de posse, atrativo e com golo. Com a Juventus FC a ser ainda a única potência capaz de tanto dominar a nível nacional como imiscuir-se na competição por êxitos europeus, as teorias enraizadas da década de 90 vindas dos apologistas do Catenaccio ainda estão bem vincadas e a evolução, apesar de contar com algumas iniciativas, ainda requer alguma consistência e tempo para ser definitivamente estabelecida e sedimentada. Até lá, algumas faíscas vão iluminando um futebol ainda obsoleto e sem grandes noções práticas de ataque continuado, organizado e dinâmico.

Artigo escrito por: Lucas Brandão
Imagens: sportefun.com / ansa.it / goal.com / forzaitalianfootball.com

27 de agosto de 2014

Futebol Global 2014/15: Confronto entre individualidades e coletivo é o maior desafio de Laurent Blanc (análise de 20 a 26 de agosto)

Reflexão: Nova época, ambições intactas. O PSG, clube adquirido pelo empresário Nasser Al-Khelaïfi em 2011 (com o objetivo de tornar os parisienses num dos clubes mais poderosos do Velho Continente), parte para 2014/15 com o objetivo primordial de conquistar o tricampeonato francês. Um feito que a confirmar-se será inédito na história do clube (conta apenas com quatro ligas gaulesas) e que apenas AS Saint-Étienne, Olympique de Marseille e Olympique Lyonnais conseguiram alcançar ao longo das setenta e cinco edições da Ligue 1. Na teoria o PSG terá como adversários diretos os milionários do AS Monaco FC (um dos novos ricos do futebol europeu orientado pelo português Leonardo Jardim), o renovado Olympique de Marseille (de Marcelo Bielsa) e o Lille OSC (terceiro classificado do último exercício).

20 de agosto de 2014

Futebol Global 2014/15: O bom filho a casa torna (análise de 13 a 19 de agosto)

Reflexão: Sete anos depois, Nani voltará a vestir de verde e branco. Como resultado da transferência de Marcos Rojo para o Manchester United FC o internacional português retorna ao clube no qual completou a sua formação,  se estreou ao mais alto nível e se moldou enquanto profissional e ser humano. O facto de ser um empréstimo até ao final da temporada favorece totalmente o clube lisboeta já que por um preço elevado Nani nunca regressaria a Alvalade e o Sporting CP dificilmente procuraria um  jogador com valências superiores ao português. Acrescentando o facto de o clube leonino estar completamente livre de encargos (os "red devils" irão pagar a totalidade do salário auferido por Nani) podemos muito bem considerar este como um dos melhores negócios do Sporting CP nos últimos anos. Um negócio resolvido com sucesso por Bruno de Carvalho cuja gestão tenta corrigir e diminuir os erros cometidos por direções anteriores. O percurso não é nada fácil e terá de ser construído com passos seguros (algo que vem sendo feito desde a sua ascensão em 2013). Como tal, o apelo à compreensão por parte da massa associativa é fundamental para que o clube recupere da grave crise que assolou Alvalade

13 de agosto de 2014

Futebol Global 2014/15: Será Islam Slimani assim tão insubstituível? (análise de 6 a 12 de agosto)

Reflexão: Os últimos dias têm sido conturbados no reino do leão. Alguns jogadores que se valorizaram no Mundial 2014, casos de Marcos Rojo e Islam Slimani, têm demonstrado vontade em deixar o clube de Alvalade. Neste artigo concentramos as atenções especificamente no caso do internacional argelino. 

8 de agosto de 2014

Espaço Entrelinhas: Rio Ave para a história!

“As armas e os Barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana”

  Este excerto de Os Lusíadas serve de mote para o Espaço Entrelinhas de esta semana. Um dia um conjunto de bravos portugueses aventurou-se além-mar e descobriu novas paragens, novos povos, novas culturas. Foi um momento glorioso da nossa história e um momento de afirmação de Portugal à escala global que Luís Vaz de Camões cantou de forma sublime nesta epopeia, imortalizando o heroico povo português.

  A evocação deste momento presente na memória coletiva de todos nós servir-me-á de ponto de partida para a análise ao atual momento do Rio Ave FC. O clube de Vila do Conde está a viver um dos momentos mais altos dos seus 75 anos de história. Conta com 20 presenças no convívio dos grandes, no mais alto escalão do futebol português. Após um período inicial de alguma intermitência entre subidas e descidas de divisão, o clube foi consolidando a sua posição na Primeira Liga. Irá iniciar a sua sexta temporada consecutiva como primodivisionário e o seu crescimento tem sido notório. Desde a última subida de divisão, que aconteceu na temporada 2007/2008, o Rio Ave alcançou o 12º lugar nas duas temporadas que se seguiram ficando situado, sensivelmente, a meio da tabela classificativa, um 8º lugar em 2010/2011, já “à porta” da Europa, um 14º lugar em 2011/2012, um sensacional 6º lugar na temporada 2012/2013 e um tranquilo 11º lugar na temporada transata.

  Sob o comando de Nuno Espírito Santo o Rio Ave fez duas das melhores épocas desportivas da sua história. O 6º lugar na Liga Zon Sagres alcançado em 2012/2013 apenas foi suplantado por um 5º lugar obtido na longínqua época de 1981/1982. A exigência e a competitividade do futebol português dos nossos dias é, todavia, completamente distinta da que se verificou no passado. O feito alcançado por si só já colocaria a época 2012/2013 na história do clube vilacondense. No entanto os feitos alcançados pelo jovem treinador em Vila do Conde não se ficaram por aqui visto que o Rio Ave em 2013/2014 regressou ao Jamor 30 anos depois para disputar a final da Taça de Portugal e conseguiu uma presença inédita na final da Taça da Liga. Em ambas as partidas acabou por perder perante o atual campeão nacional, o SL Benfica mas vendeu cara as derrotas.

  Fruto da temporada histórica e para grande alegria de todos os sócios e adeptos rioavistas e para a cidade de Vila do Conde, o Rio Ave qualificou-se pela primeira vez para uma competição europeia. Um prémio justo e a consolidação de um clube que já se pode considerar um histórico do futebol português. Quis a sorte que os suecos do IFK Gotemburgo apadrinhassem a estreia do clube português nas competições europeias. Um clube que conta no currículo com duas Taças UEFA (atual Liga Europa) conquistadas em 1981/1982 e 1986/1987.

  Um golo solitário do egípcio Ahmed Hassan deu a vitória ao Rio Ave na Suécia. O ponta de lança entrou assim na história dos vilacondenses ao tornar-se no primeiro jogador do clube a fazer o gosto ao pé na Europa do futebol. Estreia auspiciosa dos pupilos agora comandados por Pedro Martins. Após um bom trabalho efetuado na Madeira ao serviço do Marítimo, foi o homem escolhido para suceder a Nuno Espírito Santo que rumou ao Valência de Espanha. Na noite de ontem, a jogar perante o seu público, o Rio Ave confirmou a passagem ao playoff da Liga Europa num jogo que foi controlado desde o início e que culminou com um empate sem golos mas que teve sabor a vitória.

  Fez-se história em Vila do Conde. Tal como um dia os portugueses se aventuraram “por mares nunca antes navegados” também o Rio Ave, oriundo de uma terra descrita por José Régio como estando “entre pinhais, rio e mar” partiu à aventura. A sorte colocou novamente a Suécia como destino dos vilacondenses, desta vez para defrontar o Elfsborg.

  Aconteça o que acontecer o Rio Ave está a viver o período mais áureo da sua história. Não tendo grandes individualidades, faz do coletivo a sua principal arma. É notório o espírito de solidariedade e entreajuda entre os atletas que se apresentam em campo sempre de uma forma aguerrida. Vive-se um clima de festa em Vila do Conde!

  O próximo capítulo desta história escrever-se-á já no próximo domingo em Aveiro. O conjunto vilacondense irá reencontrar o SL Benfica. Em disputa estará a Supertaça Cândido de Oliveira num jogo que abrirá oficialmente a época 2014/2015.

Artigo escrito por: Adolfo Serrão
Imagens: fpf.pt / rioave.net / rr.pt

6 de agosto de 2014

Futebol Global 2014/15: É urgente criar condições para o jovem jogador português (análise de 30 de julho a 5 de agosto)

Reflexão: Finalizado o Campeonato da Europa U19 na Hungria, abre-se espaço para algumas notas. Portugal chegou à final da competição, tendo perdido pela margem mínima frente à congénere germânica. Focando na seleção orientada por Hélio Sousa, há que destacar algumas individualidades. 

2 de agosto de 2014

Espaço Entrelinhas: Entre incógnitas, dúvidas e pontos de interrogação

   Estávamos na tarde de vinte de abril de 2013, domingo de Páscoa, e o árbitro Carlos Xistra concedia dois minutos de compensação. O “inferno” da Luz estava reativado, como há muito não se via. “O campeão voltou!”, gritavam, em êxtase, os adeptos encarnados… A vida por vezes prega-nos partidas. O mesmo minuto 92 que num passado recente assombrava constantemente as hostes benfiquistas era agora o minuto da confirmação. O SL Benfica sagrava-se campeão nacional. Era caso para dizer que Jesus tinha ressuscitado!

   Campeonato nacional, Taça da Liga e Taça de Portugal. O triplete foi alcançado pelas “águias”. Uma época brilhante, confirmou Jorge Jesus como um dos melhores treinadores da atualidade, revelou Jan Oblak como um dos mais promissores guarda-redes da Europa, mostrou-nos um rejuvenescido Luisão, um dos bastiões do título, o líder da equipa, transmissor de uma tranquilidade e segurança notáveis a todos os companheiros da defensiva encarnada que efetuou uma das suas melhores temporadas desde que chegou a Portugal e consolidou Enzo Pérez como um dos médios mais intensos da atualidade. Durante toda a temporada foi notória a sua garra, a sua intensidade e entrega ao jogo. O argentino foi o “motor” desse Benfica que ganhou tudo em Portugal e chegou à final da Liga Europa. A sua cotação subiu em virtude do excelente trabalho desempenhado. Um médio box to box de grande qualidade, tanto a atacar como a defender. Poderoso fisicamente, com um pulmão incansável, uma visão de jogo apurada à qual se junta a raça e a garra típica dos futebolistas latinos. Um guerreiro em campo que regressou à seleção das Pampas pela mão de Sabella, sagrando-se vice-campeão mundial no Brasil.

   Passados poucos meses deparamo-nos com um clima de incerteza na Luz. Depois de novamente efetuar uma boa prestação europeia, chegando ao jogo decisivo da Liga Europa pelo segundo ano consecutivo, à qual se juntou uma prestação a nível interno absolutamente irrepreensível, naturalmente que os principais jogadores encarnados se tornaram num alvo apetecível dos principais clubes da Europa, que dispõem de orçamentos muito superiores em comparação com os grandes de Portugal. À entrada para o derradeiro mês do mercado de transferências o SL Benfica, campeão em título é ainda uma incógnita.

   André Gomes e Rodrigo, já em janeiro tinham sido adquiridos por um fundo, que posteriormente os colocou no Valencia CF. Oblak rumou a Madrid para reforçar o campeão Atlético, sendo o substituto do belga Thibaut Courtois. Siqueira, que esteve na Luz cedido pelo Granada CF, teve o mesmo destino. Garay, que formou durante épocas, juntamente com Luisão, uma das duplas de centrais mais eficazes da Europa, é reforço do FC Zenit St. Petersburg. Lazar Marković confirmou desde cedo o vaticínio que lhe era apontado. Rotulado como um jovem prodígio, provou no Benfica que tais palavras não eram vãs. O jovem de 20 anos mudou-se para a cidade dos Beatles onde irá, certamente, evoluir ainda mais ao serviço do Liverpool. Sílvio, outro dos protagonistas dos títulos almejados, regressou ao Atlético de Madrid. A esta lista de saídas poderá, em breve, juntar-se Enzo Pérez, cujo nome é muito apreciado no Mestalla. A recente compra do Valencia CF pelo multimilionário Peter Lim poderá levar o argentino a reencontrar Rodrigo e André Gomes a muito breve trecho.

   O plantel campeão está, com efeito, dizimado. É o preço do sucesso. Importa realçar o esforço realizado pela direção do SL Benfica na temporada transata, na qual segurou os seus jogadores mais importantes, acabando por conseguir o tão desejado troféu. No entanto, todos os clubes portugueses, nomeadamente os principais, estão “obrigados” a vender para assim conseguirem fazer face a tantos encargos. Esse esforço acabou por ser compensado desportivamente na época transata, mas nesta temporada a vertente financeira terá, irremediavelmente, que ser compensada. O lado económico-financeiro e o sucesso desportivo são dois fatores que podem servir de explicação para esta autêntico êxodo dos principais futebolistas do SL Benfica.

   Acontece que nos últimos anos os “encarnados” têm apresentado sucessivamente planteis altamente competitivos, recheados de atletas de qualidade reconhecida e craveira internacional. Diversamente, à entrada para a temporada 2014/2015 têm chegado ao Estádio da Luz jogadores jovens, na sua maioria provenientes do Brasil, que se afiguram como ilustres desconhecidos para a generalidade dos aficionados. Exceção feita para aqueles que regressaram de empréstimo ou para Eliseu, Bebé, Djavan, Candeias e Derley. O primeiro, experiente internacional português que é há muito um desejo expresso de Jorge Jesus, os restantes com passagens por equipas do nosso campeonato. Bebé passou pelo Rio Ave FC e, na última época, pelo FC Paços de Ferreira, emprestado pelo Manchester United FC, Djavan foi recrutado à Académica, Candeias e Derley chegaram da Madeira, respetivamente provenientes do CD Nacional e do CS Marítimo.

   As lesões de Luisão, Jardel e Lisandro López concorreram para que Jorge Jesus apostasse nesta pré-temporada numa linha defensiva inédita da qual Maxi Pereira, que teve direito a um período de férias mais alargado em virtude da sua participação no Mundial do Brasil, é o único representante da equipa da temporada transata. Desde cedo se percebeu, devido à elevada opção de compra inserida no seu contrato de empréstimo, que Siqueira seria apenas uma solução temporária para o lado esquerdo da defesa. A sua saída fez com que o Benfica retomasse a busca do lateral esquerdo, posto que teve no já citado Siqueira um jogador de indiscutível qualidade mas que representa para as “águias” uma espécie de Santo Graal desde a saída de Fábio Coentrão para o Real Madrid. Esta temporada foram contratados Djavan, Benito e Eliseu.

   A zona intermediária é totalmente nova. O sérvio Fesja, a recuperar de lesão, só volta em 2015. Enzo Pérez gozou férias após a sua honrosa participação no Mundial, ainda não efetuou qualquer jogo e tem sido um dos principais agitadores do mercado, permanecendo a dúvida em torno da continuidade (ou não) do argentino. Tem pontificado Rúben Amorim, internacional português que não foi um indiscutível no onze da temporada transata, embora tenha sido de grande utilidade para a conquista do triplete e a chegada a mais uma final europeia, sendo uma peça fulcral na natural rotatividade que Jorge Jesus empreendeu. No ataque continuam Lima, Salvio e Gaitán. Relativamente a Nico é, na minha ótica um dos principais craques do futebol português e um dos últimos representantes em solo luso dos chamados maestros, aqueles futebolistas de técnica apurada que exploram como ninguém o espaço entrelinhas. Agraciado com a mítica camisola 10 no que para mim se tratou de uma manobra de charme para que permaneça no clube, ainda não é um dado adquirido que tal aconteça. Óscar "Tacuara" Cardozo é outro velho conhecido que continua a fazer parte do plantel encarnado. Longe do fulgor de outros tempos e não sendo um indiscutível poderá estar perto de sair rumo ao futebol turco.

   Deste modo, como que retalhado, estou em crer que este SL Benfica que tem acumulado derrotas na pré-temporada não será o mesmo que se irá apresentar no dia 10 de agosto para disputar a Supertaça Cândido de Oliveira, naquele que será o primeiro jogo oficial da temporada. 

   Contrariamente ao que se verificou nos últimos anos ainda não chegaram os tais reforços internacionais pelos seus países, aqueles upgrades de peso, que entram “de caras” no onze inicial. Dos jogadores que estiveram emprestados e que têm tido minutos, apenas Ola John me parece reunir condições para continuar. Lisandro López, quando recuperar será, a meu ver e perante as opções atualmente disponíveis, o natural substituto de Garay sendo que, no mínimo, deverá continuar no plantel. Luisão apesar dos seus 33 anos continua a ser um jogador fundamental. Consigo todo o setor parece funcionar melhor e sem a sua voz de comando a equipa ressente-se claramente. Jardel terá sempre uma palavra a dizer, ele que à entrada para a sua quinta época de águia ao peito tem correspondido sempre que é chamado. O SL Benfica terá necessariamente que mudar. Daí que não se possam tirar grandes ilações até ao momento. Os “encarnados” são a principal incógnita para esta temporada.

   Entre o desmantelamento do plantel campeão nacional, os regressados e os reforços temos visto uma equipa mais “portuguesa”, mais made in Benfica e com muitos jogadores da formação. A começar pelo veterano guarda-redes Paulo Lopes, que tem beneficiado da ausência, até ao momento, de um sucessor de Oblak para ter minutos, ao qual se juntam João Cancelo, André Almeida, Victor Lindelöf, Bernardo Silva, João Teixeira, Ivan Cavaleiro e Nélson Oliveira. Acredito que esta mudança de paradigma seja apenas momentânea, fruto de tantas ausências motivadas pela venda e pelas lesões de potenciais titulares e/ou jogadores da equipa principal. No entanto estes jovens valores têm tido minutos na equipa A e alguns têm deixado bons apontamentos. É certo que precisam, sobretudo, de jogarem com regularidade mas é sempre uma oportunidade de se mostrarem aos adeptos e a Jorge Jesus. Apesar de se encontrar ainda na sua fase de desenvolvimento, João Cancelo tem mostrado mais do que o recém-contratado lateral brasileiro Luís Felipe e apresenta-se, na minha ótica, como uma melhor alternativa a Maxi Pereira.

   Entre os poucos destaques da pré-temporada “encarnada” destacam-se dois jovens centrocampistas: João Teixeira e Anderson Talisca. O primeiro é produto das escolas do Benfica, tem aproveitado a falta de opções do meio campo para ter minutos e a verdade é que tem sido uma espécie de raio de sol entre a sombra que tem sido esta pré-temporada. Denota uma boa capacidade de posicionamento e de passe, sabe aparecer em zonas de finalização e tem uma enorme margem de progressão. Deverá melhorar com o tempo a sua concentração, intensidade e capacidade de decisão. Não há melhor técnico para moldar este jogador que Jorge Jesus. O segundo é um jovem brasileiro que chegou do EC Bahia. Desde o início que tem sido aposta inicial e tem correspondido com boas exibições. Forte nas bolas paradas, tem uma intensidade, uma visão de jogo e uma qualidade de passe aliada à qualidade técnica dos futebolistas brasileiros que fazem dele o principal reforço efetivo das águias até ao momento. Permaneça ou não Enzo Pérez que o jovem brasileiro parece desde já ter agarrado um lugar no miolo do campo encarnado.

   Entre tantas incógnitas, dúvidas e pontos de interrogação a chave do sucesso deste SL Benfica estará, seguramente, no seu treinador. Jorge Jesus é um treinador experimentado, campeão nacional, conhecedor do nosso futebol como poucos, com uma carreira consolidada. Já demonstrou num passado recente grande capacidade de adaptabilidade face às maiores adversidades. Transformou Fábio Coentrão num lateral esquerdo de top-mundial, recebeu Matić como um “número oito” que era reserva do Chelsea e fez dele um trinco de classe após a saída de Javi García (outro jogador de sucesso moldado por JJ). Em pouco tempo o sérvio foi cobiçado pelos grandes tubarões europeus e regressou aos blues e a Londres a pedido de Mourinho e pela porta grande. Foi o homem que reposicionou Enzo Pérez quando foi novamente colocado numa situação de necessidade (Witsel saíra para o Zenit) e hoje é um médio de gabarito, titular da sua seleção e muito apreciado no mercado.

   Jesus sabe como moldar os jogadores à sua disposição em função das necessidades da equipa, sem nunca descurar a grandeza de um clube como o Benfica. O seu trabalho a nível tático realizado com os seus atletas é impressionante. Além dos jogadores citados supra há ainda o exemplo de Marković que embora já tivesse o talento foi muito bem trabalhado pelo técnico das “águias” naquela que foi a sua primeira experiência ao mais alto nível na Europa do futebol. A sua evolução nomeadamente no que se refere aos processos defensivos foi notória e reveladora do trabalho de um dos melhores treinadores da atualidade.

   A manutenção de JJ é sem dúvida um trunfo importante face à incerteza que é o atual Benfica. A manutenção de jogadores como Enzo, Salvio e Gaitán ajudaria indubitavelmente o processo. Porém, aconteça o que acontecer e tendo em conta os antecedentes de sucesso do técnico o SL Benfica encarará a época que se avizinha com a intenção de revalidar o título. Resta esperar o início oficial da temporada e… o fecho do mercado.

Artigo escrito por: Adolfo Serrão
Imagens: maisfutebol.iol.pt / rr.sapo.pt / abola.pt / goal.com