12 de março de 2014

Futebol Global: análise da semana entre 4 e 10 de março

Três reflexões: 

1. Portugal vs Camarões (5-1)
Marcadores: Cristiano Ronaldo 21' e 84', Raúl Meireles 66', Fábio Coentrão 67' e Edinho 76'; Vincent Aboubakar 43'

Os jogos amigáveis servem para experimentar novos sistemas, novas formas de encarar uma partida e, sobretudo, usar jogadores que teoricamente não tenham lugar assegurado no onze inicial. Na quarta-feira, Paulo Bento decidiu arriscar num modelo completamente novo, um declarado 4-4-2 losango, com o debutante Rafa a atuar nas costas de Ronaldo e de Ivan Cavaleiro, como "falso-9". A estratégia parecia boa, mas o primeiro tempo acabou por ser algo aborrecido. Apesar de um começo interessante, com dinâmica e algumas chegadas à área, Portugal foi perdendo critério na organização ofensiva. A ocupação excessiva de zonas interiores por parte dos dois homens mais avançados retirava profundidade, largura e criação de desequilíbrios. O tento de Ronaldo (tornou-se no melhor marcador de sempre da seleção nacional) acabou por mascarar (ainda que temporariamente) algumas dificuldades dos lusos na contenda. Os Camarões, perante a inoperância do meio-campo português, dispuseram de longos períodos com circulação de bola. A zona intermédia colocava intensidade na partida, enquanto Aboubakar foi aos dando água pela barba aos centrais, nomeadamente a Luís Neto. E foi o próprio avançado do FC Lorient (doze golos marcados na Ligue 1) que à saída para o descanso fez justiça no marcador. Para a etapa final, pedia-se ao técnico nacional que fizesse um retrocesso ao passado e voltasse à matriz de jogo que unicamente caracteriza Portugal.  Com Ronaldo na extrema esquerda, Cavaleiro na faixa oposta e Edinho como referência ofensiva, Portugal tomou conta das rédeas da partida, submeteu praticamente o adversário ao seu meio-campo, obrigando-o a errar. Assim, os golos surgiram com naturalidade. Meireles (após um erro de Chedjou) e Coentrão faturaram no espaço de dois minutos e deram tranquilidade ao conjunto português. O jogo não era brilhante, mas ia servindo para demonstrar alguma pontaria afinada, mesmo perante a ausência de muitos pretendentes à posição 9. Mas CR7 ainda haveria de aumentar a sua conta pessoal, com um golo e uma assistência. O último golo da noite demonstrou força, inteligência e sentido de oportunidade. Digno do melhor jogador do mundo. Uma palavra para os Camarões: apesar de alguma experiência (Assou-Ekotto, Song, Makoun ou Eto'o), as perspetivas para o Mundial 2014 não são animadoras. Tal como tínhamos afirmado há algumas semanas atrás (ver aqui), os camaroneses partem como "outsiders" do grupo A, pelo que a soma de pontos já será positivo. 

2. Alemanha vs Chile (1-0)
Marcador: Mario Götze 16'

Em Estugarda, o jogo não se antevia fácil para a Alemanha, adversária de Portugal no grupo G do Mundial 2014. E assim foi. O Chile (equipa algo subvalorizada por alguns adeptos do futebol) estendeu-se desde o primeiro minuto pelo campo todo, jogando a toda a largura do terreno, sem medo do oponente e exercendo bons níveis de intensidade e pressão sobre as linhas mais recuadas dos germânicos (nomeadamente por Vargas, Vidal e Alexis). Quem segue Jorge Sampaoli sabe que este é um confesso discípulo de Marcelo Bielsa. O plano para este jogo consistiu mais uma vez em ser fiel a essa filosofia, apostando num futebol atrativo, ofensivo e com constantes triangulações. O golo da Alemanha surgiu logo após o primeiro quarto de hora. A partir daí, contam-se pelos dedos as oportunidades criadas pela Die Mannschaft. O Chile não desistiu, procurou incessantemente o golo, mas esbarrou nos reflexos do guardião Neuer e nos ferros da baliza germânica. Destaque para a flexibilidade tática verificada na equipa do continente sul-americano. Sampaoli iniciou com um 4-3-1-2 (Vidal no apoio a uma dupla de avançados móveis, que caía frequentemente nas alas), mas transitou na segunda parte para um já tradicional 3-5-2. Outra nota interessante, mas no lado oposto, foi o facto de Löw ter convocado alguns jogadores que atuam em clubes modestos do futebol alemão, como Mathias Ginter ou André Hahn. Uma prática que muitas outras seleções deveriam atender. Mas voltando ao jogo, os assobios durante grande parte do segundo tempo são elucidativos da falta de criatividade e dinâmica no ataque alemão. Pode-se falar em algumas ausências, em experiências, mas a verdade é que a Alemanha não convenceu.  

3. SL Benfica vs GD Estoril Praia (2-0)
Marcadores: Luisão 6' e Rodrigo Moreno 19'

Numa jornada marcada pela estreia de Luís Castro no comando do FC Porto e pela arbitragem polémica no encontro do Sporting CP em Setúbal, o SL Benfica aproveitou para reforçar a sua liderança na Liga ZON Sagres, ao bater o GD Estoril Praia por 2-0. Com isso, os lisboetas seguem com apenas um golo consentido nas últimas dezasseis partidas, algo que diz bem de algumas mudanças operadas por Jesus em termos do modelo de jogo. Hoje vemos uma equipa cada vez mais segura em termos defensivos, desde a pressão exercida por Rodrigo e Lima à contenção e ocupação de espaços pelos defesas, passando naturalmente pela agressividade tática imposta no meio-campo. Fejsa esteve em destaque, sobretudo porque recupera muitas bolas mas também sabe conduzir com critério o esférico. Além disso, são comuns as suas descidas até à zona dos defesas centrais (normalmente situando-se à direita) para iniciar o processo de construção. Ao baixar um pouco as linhas no passado domingo, o SL Benfica deu tempo de posse de bola à turma de Marco Silva (ao intervalo tinha 65%) e pouco mais. A produção ofensiva dos canarinhos foi praticamente nula (apenas na segunda parte se viu algo), já que Jesus fez alinhar uma equipa muito compacta, que sabe impor os ritmos da partida (Enzo Pérez tem um papel determinante neste ponto), mudar as zonas de pressão e, acima de tudo, controlar o adversário, não o deixando aproximar da área. O SL Benfica deixou de querer transformar cada posse de bola num ataque vertiginoso, passando a adotar uma filosofia que permite segurar o resultado sem correr demasiados riscos. Não se trata de pragmatismo, trata-se de aprender com os erros do passado e verificar que jogar constantemente ao ataque pode não garantir títulos. Jorge Jesus estudou a lição e os resultados estão a vista, com os encarnados a caminhar a passos largos para o trigésimo terceiro campeonato nacional do seu historial. 

Equipa da semana (4-4-2): José Manuel Reina (SSC Napoli); Antonio Rukavina (Real Valladolid CF), Marko Baša (Lille OSC), Steven Caulker (Cardiff City FC) e Marcelo (Real Madrid CF); Thomas Müller (FC Bayern Munich), Fran Rico (Granada CF), Esteban Cambiasso (FC Internazionale Milano) e Ezequiel Lavezzi (PSG)Klaas-Jan Huntelaar (FC Schalke 04) e Cristiano Ronaldo (Real Madrid CF)


Topo: Zlatan Ibrahimovic. Que mais se poderá dizer do fantástico avançado do PSG? Em Bastia, Zlatan provou que não é apenas um jogador que se precoupa em visar a baliza contrária. A forma como se dá ao jogo, baixa no terreno para oferecer linhas de passe aos companheiros e ainda oferece assistências aos companheiros demonstra o facto de este ser um dos jogadores mais completos da atualidade. Já conta com passagens por Holanda, Itália e Espanha, mas é na Ligue 1 que semana após semana vem construindo registos verdadeiramente impressionantes. Pode-se discutir o facto de o campeonato francês não oferecer a mesma competitividade que as principais ligas europeias, mas quem tem quarenta golos em outros tantos jogos esta temporada só merece todas os elogios. A juntar a isso, dezasseis assistências que provam a importância do sueco em todos os momentos da partida. 

Fundo: Paulo Fonseca. Ao fim de praticamente nove meses, o técnico português deixou o FC Porto. A gota de água cingiu-se ao empate com o Vitória SC, que deixou os azuis e brancos a nove pontos da liderança. Praticamente tudo já foi esmiuçado nos últimos dias sobre esta saída programada (se não fosse agora,  com certeza seria no final da temporada). Porém, há que reforçar três ideias. Primeiro, o timing. Contrariamente à maioria dos adeptos, Pinto da Costa depositou total confiança no ex-técnico do Paços de Ferreira até ao último momento. Inclusive, foi o próprio que tentou adiar ao máximo o inevitável. Se este despedimento tivesse ocorrido logo após a copiosa derrota em Coimbra, o FC Porto certamente teria feito melhor figura a nível interno (já para não falar ao nível das competições europeias). Num ápice, o conjunto portista averbou três derrotas (SL Benfica, CS Marítimo e GD Estoril Praia) que praticamente disseram o adeus ao título nacional. Em segundo lugar, apesar de ter demonstrado falta de estofo para orientar uma equipa como o FC Porto, Fonseca não teve muitos recursos à sua disposição. O plantel apresenta algumas lacunas em certas posições, partiu para 2013/14 sem renovar contrato com nenhum dos três capitães e portou-se mal nos processos com Izmaylov, Fucile e Iturbe. A própria política de contratações não foi a melhor e os cerca de trinta e um milhões de euros investidos não trazem soluções a curto prazo, que permitam colmatar rapidamente as saídas de elementos como Moutinho e James Rodríguez. Juntando estes aspetos a uma rol imenso de experiências no meio-campo (um setor que durante muitos anos permaneceu inalterado), o resultado não poderia ser o melhor. Em terceiro e último lugar, a direção do FC Porto cometeu alguns erros que podem custar uma época. A escolha de Fonseca foi um erro de casting por parte de Pinto da Costa, mas poder-se-á questionar toda a estrutura da SAD portista. Face à saída do presidente dentro em breve, as lutas pelo poder surgem de forma natural, o que acaba por afetar o rendimento de todos. Mais um exemplo de que as equipas só conseguem obter sucesso se garantirem uma boa estabilidade entre o treinador e toda a estrutura envolvente. Algo que não aconteceu.

Frase: “Já sabia que o recorde ia surgir naturalmente. Falei há instantes com o Pauleta, que me endereçou os parabéns. Não procuro recordes, as coisas acontecem com naturalidade, consequência do esforço e da dedicação. Jogando nesta excelente seleção que Portugal tem, mais tarde ou mais cedo marcaria de novo. Jogo há dez anos na seleção e sinto-me, com esta nova marca, mais motivado do que nunca, procurando sempre fazer mais e melhor. Agora, vamos ver se consigo o recorde de internacionalizações, mas se tal suceder acontecerá... naturalmente" - Cristiano Ronaldo, internacional português, depois do triunfo sobre os Camarões.

Artigo escrito por: Ricardo Ferreira
Imagens: globoesporte.globo.com / bleacherreport.com / benficagloriosos.blogspot.com / europe1.fr / rr.sapo.pt

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